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Electro-Funk faz parte do hip hop?

Electro-Funk faz parte do hip hop?

ESPALHA --->

Por HELIOBRANCO

Venho aqui falar de um gênero musical pouco compreendido atualmente, mas que, num passado muito recente, foi trilha sonora do hip hop e do chamado “breakdance” – o electro-funk.

Sou local de São Paulo – capital – e aqui nada se fala ou se toca deste gênero, sendo que hoje ele é um dos gêneros musicas que mais se reciclam e se inovam no mundo, em especial na Europa, com um grande selo representando uma cena sempre forte e em constante movimento – a Dominance Records. Aqui no Brasil, eu senti que temos ainda muitos fãs e aficionados pelo electro funk, em especial em Santos, Rio de Janeiro, Vitória, Belo Horizonte, Recife, Brasília, São Luís, para mencionar algumas regiões, que estão sedentos por novos artistas, músicas e shows.

Com isso na cabeça, com o apoio do DJ Cleston (Detonautas) e Hugo “The Bassman”, locais do Rio de Janeiro, formamos o BRAZILIAN BASS CONNECTION cujo objetivo é resgatar o gênero no Brasil, produzir e lançar novas músicas e artistas. Já lançamos dois singles em vinil. Isso mesmo: VINIL! – “T Boyz DL (pela Cut It Up Def – USA) e “Serenity (pela BBC Music – nosso selo), que logo de cara já fez parte da trilha do maior evento de B-Boying’ do planeta – o Battle Of The Year – em seu álbum de comemoração de 25 anos de congraçamento.

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05 Electro-Funk faz parte do hip hop?Observo que mesmo com iniciativas como as que tivemos, parte da cultura hip hop simplesmente ignora que o electro funk, inicialmente incentivado por nada menos que Afrika Bambaataa – o padrinho do hip hop – com o seu “Planet Rock”, marcou território para a música eletrônica dentro deste hip hop. As diferentes vertentes musicais desta cultura são amplamente estudadas, desenvolvidas e consolidadas em produtos no mundo todo. Já no Brasil, o preconceito “mudo” e absurdo da mídia, dos DJs e de alguns “promoters”, não permitem uma maior diversidade musical dentro deste universo imenso chamado hip hop.

Para melhor ilustrar o que é o “electro-funk”, vou apresentar aqui um texto produzido por meu amigo RODRIGO PLAÇA (electro rod), um estudioso do estilo, onde vocês poderão compreender mais profundamente do que estou falando. Leiam e depois me digam se o electro funk não é a trilha original do hip hop:

O electro é, sem dúvida, o mais incompreendido de todos os gêneros da black music e música eletrônica, porém, um dos gêneros mais influentes na música contemporânea. A confusão começa na difusão de seu próprio nome, que para uns é “Electro” e, para outros, “electro-funk”. Electro é, antes de mais nada, uma grande expressão que abrange uma diversidade de estilos: electro-funk, electro-rap, electro-dance (mais tarde seria freestyle), electro vocoder, entre outros, que são suas subcategorias.

Embora exista um certo número de artigos sobre o estilo, sites e pouquíssimos livros, ao longo dos anos, com um justo grau de visão, o tema raramente é abordado com profundidade. Uma das principais razões para que esse estilo continue a ser um mistério para muitas pessoas é o fato dele ter sido muito marginalizado, e assim mantendo suas raízes no underground, que é onde se encontra o seu público alvo. O electro-funk foi baseado no funk dos anos 70, mas com uma grande diferença: As bandas não precisavam mais gastar fortunas no estúdio, pois o som era feito através de máquinas, e o produtor virou o “homem-banda”, o principal membro do grupo. Nesse momento, o termo “electro” acabou tornando-se popular nessa sonoridade funk da década de 1980, pois o funk dessa década estava ficando cada vez mais eletrônico, algo bem diferente do funk clássico da década anterior.

No início da década de 1980 em Nova York, o nível de inovação musical foi surpreendente. A diversidade das músicas durante este período era algo mágico, pois você nunca sabia o que estava por vir, pois tudo era imprevisível. O electro era um perfeito alongamento da sonoridade que artistas da música eletrônica – como Kraftwerk e Gary Numan -, e artistas da black music – como Herbie Hancock, George Clinton – buscavam nos anos 70, através do uso inovador de instrumentos eletrônicos. Antes mesmo da música “Planet Rock”, de Afrika Bambaataa & Soul Sonic Force – que é considerada como o marco zero do electro – estourar em 1982, músicas como “You’re One For Me” do D-Train, “Thank To You” do grupo Sinnamon, “On A Journey” do grupo Electrik Funk (de onde resulta o termo electro-funk) apresentavam uma sonoridade electro-funk antes mesmo deste termo existir, que acabou se solidificando também com o lançamento da música “Electrophonic Funk” do grupo Shock, que saiu em 1982 pela gravadora Fantasy Records, de Los Angeles.

O electro-funk seria um funk produzido com equipamentos eletrônicos como Drum Machine, Sintetizador, Vocoders, somados a uma linha de vocal “soulful”, puxada pro r&b e soul. Artistas como Midnight Star, Windjammer, Reggie Griffin, Kiddo, Active Force, entre outros, são representantes deste estilo. Neste mesmo momento, diversos MCs e DJs começaram a utilizar estes mesmos recursos para produzir sua música (somados a outros equipamentos como DX7, Linn Drum, TR 808,entre outros) o que acabava sendo menos dispendioso do que alugar um estúdio e/ou fazer ao vivo jam sessions com músicos, por exemplo.

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Então, a partir de 1982, muitos dos artistas que estavam envolvidos no que podemos chamar de “primórdios do hip hop”, optaram por anexar o electro em sua sonoridade, somando as rimas de um MC nessa tal produção eletrônica, criando assim o lado eletrônico do hip hop, o “electro-rap”.

Entre os milhares de sons que surgiram nessa mistura, cito aqui dois que ficaram mais “manjados” devido sua exposição em filmes que marcaram à época: a música “Play That Beat Mr DJ” de MC Globe (do Soul Sonic Force) em parceria com o Whiz Kid que, apesar de ser de 1983, ficou muito reconhecida através do filme “Beat Street” em 1984; a música “Reckless”, feita por Ice-T em parceria com o Chris The Glove Taylor, fez muito sucesso na trilha do filme “Breakin’” (no Brasil, Breakdance) também em 1984.

Apesar de alguns electros ficarem famosos nas rádios e programas da época, a maioria permaneceu no underground, principalmente àqueles artistas que lançaram discos com pequena tiragem, discos que valem uma fortuna nos dias de hoje, principalmente discos lançandos entre 1984 e 1985, uma época de ouro para o electro-rap. Um bom exemplo de um electro underground que ao mesmo tempo virou um clássico é a música “Breakdown New York Style” de Rusty P & Sure Shot Three, produzida em 1984 com a ajuda de Dwayne Omarr, um disco que é valorizado em qualquer lugar do planeta.

O electro valorizou a importância do computador, seduzindo uma geração através do tambor das máquinas, sequenciadores, sintetizadores, cortes, scratchs, samples inovadores, versões dub mixadas, tendo como vitrine estilos de dança como B-Boying, Poppin; Lockin, que a mídia batizou como Break Dance. A instrumentação do estilo é, em geral, toda eletrônica (como já havia falado), favorecendo os sintetizadores analógicos, as linhas de baixo de “funk”, sequenciados por riffs sintéticos,com efeitos sonoros criados pelos sintetizadores,tudo isso enfatizando a ficção científica e o futurismo através das letras e da sonoridade. A Roland Tr 808 é o instrumento simbólico do electro.

O electro acabou sumindo em Nova York no meio da década de 1980, mas acabou ganhando espaço na cena de Los Angeles, Miami e na Europa, principalmente na Alemanha e Holanda. Em 1989, o electro praticamente morreu nos EUA, perdendo espaço para as sonoridades que cresceram sob a influência dele. Na Alemanha ele foi crescendo de forma assustadora, e não é à toa que hoje em dia lá estão os grandes colecionadores e principais grupos desse estilo, que praticamente virou referência alemã desde o final da década de 80.

Hoje em dia, apesar de seguir desconhecido e ignorado por muitos – mesmo na black music ou na música eletrônica -, o electro continua influenciando a música contemporânea com seus belos timbres que soam cada vez mais atuais. Dos anos 80 pra cá, uma série de estilos surgiram sob sua influência: freestyle, miami bass, house, techno, guettotech, break beats, drum’n’bass e electro-clash.