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Mantronix: ‘Nós temos dois toca-discos e um microfone’

Mantronix: ‘Nós temos dois toca-discos e um microfone’

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A tecnologia e as formas de superar a falta dela sempre acompanharam os processos criativos e artísticos dos jovens da periferia. Na metade dos anos 1980, quando o rock nacional e o samba faziam discípulos nos bares e garagens, um trecho do Rap ”Needle to the groove”, do Mantronix anunciava:

original-vinil-mantronix-the-album Mantronix: 'Nós temos dois toca-discos e um microfone'

“Nós temos dois toca-discos e um microfone”. Esta era a nova forma de fazer música. Na minha vila, roqueiros, punks e sambistas, que faziam suas canções com instrumentos musicais, não entenderam bem o que estava rolando na cabeça daquela molecada que começava a usar equipamentos de baile para cantar o que muita gente chamava de “melô”.

Na época, DJs e MCs perguntavam aos organizadores e técnicos de som se eles tinham toca-discos direct drive e mixer, não apenas uma mesa de som para ligar os microfones. Já não era mais aquela ideia do MC ser somente o animador das festas, os artistas queriam cantar seus Raps.

Não é nenhuma novidade que mudanças tecnológicas impactam a música alternativa. No caso do Rap, a trajetória foi da manipulação sonora analógica ao mundo digital dos CDJs e controladoras. Além disso, os jovens artistas dos 2020 agora perguntam aos técnicos de som se eles possuem uma interface de áudio em seu setup para possibilitar o uso do auto-tune nas apresentações. O novo sempre vem.

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Fiquemos nos anos 1980 por enquanto, ”Needle to the groove” tem, além de um beat hipnotizante, um refrão robotizado, criando um clima futurista para os artistas e curtidores do rap da época, algo que, para mim – um simples amante da nova música e que não entendia nada de Hip Hop – , marcou uma posição estética, mas não é nada parecido com a sensação que o auto-tune trouxe ao Rap e que molda cenário pop até os dias atuais, pois nem todos os rappers e produtores dos 80 usaram a mesma fórmula do Mantronix.

Hoje temos diversos estilos e sub-gêneros no Rap. Na cena alternativa, uma das formas de produção mais subversivas é o drumless, que renuncia ao peso característico do boom bap para criar camadas subterrâneas com loops e diferentes ambiências.

Entretanto, a música do Hip Hop é conhecida pela repetição de suas batidas cativantes e ritmos contagiantes. A junção destes elementos forma a base de muitas músicas que amamos e dançamos.

Tudo isso faz parte da evolução dos beatmakers, os produtores musicais responsáveis por criar as batidas e os ritmos que deram origem a essa cultura musical.

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Na década de 1980, o Hip Hop estava florescendo nos bairros de Nova York, e os produtores musicais da época eram frequentemente chamados de “beat creators”. Um dos representantes dessa era é Kurtis Mantronik. Com equipamentos criados antes das máquinas da chamada Golden Era, o DJ, engenheiro de som e produtor fez suas batidas com sintetizadores, processadores de efeitos, gravadores de fita, samplers e baterias eletrônicas que ajudaram a moldar o som do Rap e o Hip Hop da época.

Vale lembrar que a maioria dos artistas brasileiros não tinha acesso à essa tecnologia por motivos financeiros e pelo difícil acesso ao conhecimento gerado no novo mundo da música independente. Por exemplo, na coletânea Hip Hop Cultura de Rua, o grupo O Credo foi o único que criou seus beats sem a ajuda de músicos que não eram do Hip Hop. Seus integrantes já usavam baterias eletrônicas.

Mantronik, que se autodenominava “o beat creator”, teve um papel fundamental na fusão entre o Hip Hop e a música eletrônica. O produtor também utilizava técnicas de sample, criando uma mistura única e inovadora que influenciou gerações de artistas.

Para entender a parada, ouça a coletânea ‘Mantronix – King Of The Beats (Anthology 1985-1988)’, que apresenta uma seleção de faixas do grupo Mantronix, que tem como sua outra metade o rapper MC Tee.

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À medida que a tecnologia, o Hip Hop e o Rap evoluíram na década de 1990, o termo beatmaker começou a ganhar destaque. Produtores como J Dilla, Madlib, Pete Rock e DJ Premier, entre outros, hoje são respeitados por sua habilidade em criar batidas cativantes a partir de samples.

Esse avanço permitiu que os beatmakers experimentassem ainda mais. O surgimento dos MPCs (Music Production Controllers), por exemplo, trouxe uma nova dimensão à produção musical, facilitando a manipulação de samples e a criação de batidas complexas, misturando sons acústicos e camadas eletrônicas.

Sou da geração dos 80, que se emocionou com aquela novidade: o som futurista, cheio de peso e groove produzido por Kurtis Mantronik, o “beat creator” e rei dos beats que tem seu lugar de destaque na história rap e da música eletrônica.

KURTIS MANTRONIK – KING OF THE BEATS – PART 1 – FOUNDATION LESSON #28 – JAYQUAN

Resumo do vídeo:

Curtis Mantronik, o rei dos beats, é um produtor e programador de beats do grupo Mantronix.
Nos anos 80, Mantronik era singular, referindo-se a Curtis Mantronik, enquanto Mantronix com “X” era plural, referindo-se ao grupo.
Curtis Mantronik sempre foi um DJ e um excelente programador de beats, sendo uma ponte entre as eras das bandas de rap e da era das máquinas de bateria.
Ele foi um dos primeiros a usar amostragem, misturando samples com a bateria eletrônica.
Seus beats foram notáveis por trazer sons de fundo para o primeiro plano, como no clássico “Fresh Is the Word”.
Curtis Mantronik é subestimado historicamente como produtor, mas sua influência e talento são fundamentais para a música Rap.
– Seu estilo único e habilidades de programação de bateria tornam sua música cativante e inovadora para os fãs da era das baterias eletrônicas.

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2 comments

comments user
Rasul88

Excelente texto! Ainda carecemos de informações com detalhes sobre os primeiros “beat creators” do RAP Br. Nos anos 90 e 2000 há muitos mateirias/suportes lançados sem a devida atenção no créditos para quem produziu ou qual o sample utilizado. Sigamos com as investigações.