Opinião: Francamente, 2016 | Por Clara Averbuck
ESPALHA --->
Eu sei que não é culpa sua, mas que papelão.
Que ano.
Teve golpe. Teve protesto Contra a Corrupção e Tudo Isso Que Está Aí com camiseta da CBF, essa instituição tão íntegra. Teve panelaço. Teve constrangimento. Teve homenagem a torturador assassino abertamente na Câmara dos Deputados.
Teve golpe. É golpe que se chama. Já entenderam que foi golpe? Insatisfação com governo se resolve nas urnas. Isso, é claro, quando estamos em uma democracia. Não estamos mais. Vivemos em um Estado de Exceção e cada precedente aberto atropelando direitos é um perigo pra mim, pra você e pra qualquer pessoa. Não só para políticos; para todos.
Aí veio a reforma trabalhista, que só vai permitir que as pessoas se aposentem aos 350 anos, que só agrada àqueles que desconhecem as agruras do trabalho braçal e não conseguem enxergar além do seu privilégio, péssimas alterações no Ensino Médio, aumento do salário de político em plena crise e agora quase se gastou uma fortuna em sorvete e Nutella pro Michelzinho, entre tantas outras medidas absurdas que passam como patrola por cima de direitos fundamentais tão duramente conquistados.
É bem triste ver o silêncio de quem ainda não percebeu que também vai se ferrar e também vai perder direitos. Se você não for um milionário, camarada, sua vida vai piorar. Se você tem um emprego e depende dele pra viver, posso te contar? Você não é rico. E vamos todos juntos pra vala. Incrível que os excelentíssimos golpistas no poder estão pintando e bordando e ainda tem gente culpando o PT por todos os males do mundo e repetindo que “nunca se roubou tanto”.
E em 2016, além da democracia, morreram personalidades fantásticas. David Bowie, Prince, Leonard Cohen, Sharon Jones, George Michael. Naná Vasconcelos, Elke Maravilha, Luiza Barros, Carrie Fisher, Cruyff, Fidel Castro, Umberto Eco, tantos, tantos. Eu sei, as pessoas morrem todos os anos, mas, como vi escrito por aí, parece até que o Bowie criou uma dimensão paralela e a galera está migrando pra lá.
Sabe quando que eu achei que sairia de novo às ruas bradando Diretas Já, como fiz com meus pais quando era pequena? Nunca. Nunca pensei. Que ano, 2016. Como disse um amigo, o cruzamento entre as tragédias do que a gente pode e não pode controlar foi especialmente danoso. Entre golpe, Brexit, Trump, uma onda conservadora mundial e a morte de pessoas que simbolizaram alguma libertação e quebra de paradigmas, é como se tivessem nos tirando as opções de ser, os lugares para viver em paz e o que podemos ou não dizer.
Mas sabe no que eu acredito, talvez um pouco Pollyana moça? Que esse estrume de ano adube nossa força de responder a tudo isso. Seja com militância, com arte, música, literatura, onde der pra ser resistência, como der. Não vamos calar. Não vamos ter medo de uma direita delirante, ignorante e retrógrada. Não vamos recuar diante de raivosos hidrofóbicos que papagaiam um discurso seboso e sequer sabem o que estão dizendo, bradando que não seremos uma Venezuela, que queriam instaurar o comunismo no Brasil. Esses delírios não podem nos inibir. Que venha 2017, que não seja tão pior e que consigamos nos reerguer.
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