Opinião: Desapropria, por favor
ESPALHA --->
Por: Fábio Emecê
Tenho a impressão de que estar junto é diferente de estar em conjunto e ações coletivas só são ações coletivas quando alguém está na linha de frente ganhando o tapa nas costas. O que seria de nós se as coisas ainda estivessem nas nossas mãos? Se os fundamentos continuassem respeitados? E as dinâmicas, ah, as dinâmicas, que porra é essa?
Pedir papo reto sempre é demais e entregar as coisas de mão beijada pra alguns é complicado, mas sei lá, tá tudo tão assim!
Se eu acredito piamente em uma cultura periférica com base em ruptura de algo já estabelecido e excludente, como uma reinvenção de expressões que um grupo disse que eu não poderia ter acesso. E a resposta, a minha resposta, a nossa resposta é: “Deixa que eu faço do meu jeito” e esse nosso jeito molda toda uma cultura urbana ao longo de quase 4 décadas, não posso querer parar e pensar pra que rumo vai isso tudo?
Tudo é remix e pra nós o sampler é um membro de uma engrenagem quase que perfeita, só que os atores, ah, os atores, aqueles que descobriram que o remix e o sampler são essenciais pra qualquer estética artística, estão onde? Consigo enxergar a precariedade que é mãe da criatividade, só que a esterilidade para essa mãe está virando política efetiva.
Qual é a cor do verbo? Da batida? Do tambor? Dos discos? Da tinha? Realmente não deveria importar, porque nunca importou pra gente de fato, pois quem nos objetificou não sabe nada sobre nós, mas tenta fazer o que nós fazemos e aí parada fica doida.
Doida porque quando começamos fazer o que é nosso, conseguimos fazer bem e além as expectativas, só que quem tenta fazer o que é nosso, mas não sabe nada sobre nós, tem a vantagem, porque não entende o que é feito como nosso, como nosso legado, não faz questão de ressaltar isso e aí a coisa desanda.
Apropriam os nossos gestos, o nosso verbo, a nossa batida, o nosso tambor, o nossos discos, as nossas tintas. Etiquetam as nossas vestes e criam regras em cima de nossas técnicas. Alguns dos nossos acordam e questionam: “Calma aí, isso é meu”, e são condenados ao subterrâneo. Por mais que alguns dos nossos tenham acesso ao subterrâneo, não deveria ser assim, não deve ser assim.
Pelo direito de entender que nossas criações são frutos do suor, sangue e dor e ressignificação de ambientes hostis. Existem códigos, regras, técnicas e trejeitos moldados tão profundamente que se confundem com as vivências desses mesmos criadores. Entender essa proposta, respeitar essa proposta e dar continuidade é um ato de libertação, e até de revolução, sem manual, para desespero dos apropriadores, pois o mundo é nosso, sem negócio!
Desapropriem, por favor, estamos pedindo, caso contrário…
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