#ArquivoAnos90: Gangsta, Gangsta
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Depoimentos, cortes e registros de um estilo que influenciou os artistas brasileiros
“Sem o N.W.A, em 1988, o rap não teria chegado aos extremos que chegou. E Eazy-E pagou o preço mais alto por esse lugar na história”, afirma o crítico Ronin Ro, no livro ‘Gangsta – Merchandising the Rhymes of Violence‘, lançado em 1996 nos EUA.
Na época, Ronin Ro, que foi colaborador nas revistas Spin e The Source, afirmou: “o gangsta rap está destruindo o hip hop“. A atitude do autor bateu de frente com o estilo criado na virada da década de 1990, gênero que elevou a popularidade do rap e que, principalmente, seguiu na contramão do estilo de MC Hammer e Vanilla Ice, sucessos de vendas no período. A versão radical da vida nas ruas construiu o N.W.A.
“Eu não diria o que eles dizem, mas estão falando sobre o que viveram“, comentou KRS-One ao ser questionado sobre a postura radical do N.W.A.
Ice T, um dos pioneiros do discurso gangster no rap, também mandou sua ideia sobre o grupo de Compton: “Quando o N.W.A apareceu, veio como um BLAM!! E levou a um novo estágio. Meus discos são sobre crime e, ao mesmo tempo, neles eu tento mostrar o equilíbrio disso, tipo: ‘Se você fizer isso, vai acabar preso’. E o N.W.A é: ‘Foda- se! Nós vamos ser presos!’. Isso não é político, isso é ‘Eu sou um gangster’. E agora é realmente um outro nível, e isso colocou L.A. no mapa”.
Nos EUA, o rap consciente e politizado de artistas como KRS-One (líder do movimento ‘Stop The Violence‘ nos anos 1980) e Public Enemy (grupo que retomou a luta contra o racismo em suas rimas) começou a perder espaço para o discurso violento do cotidiano das gangues. Mas a história provou que o rap não tem como característica a simples aceitação da ordem vigente, os anos 1990 também apresentaram grupos como A Tribe Called Quest, De La Soul, Nas, Gang Starr, Fugges, Digable Planets, entre outros.
De acordo com especialistas, o rap produzido em Nova York, região que foi berço do canto falado, passou a representar a cena alternativa, já que a ascensão do gangsta padronizou beats, rimas e temas. Na cena underground, as técnicas de discotecagem e samples de jazz deram o norte para o rap. Até o rap de Notorious B.I.G. e Wu-Tang Clan, com temas semelhantes ao gangsta de L.A., tinha uma cara própria nos beats e na forma de rimar.
“As pessoas se cansaram do gangsta rap e estão procurando ouvir algo novo“, afirmou Wyclef Jean, do Fugges, em entrevista ao jornal O Estado De S.Paulo, em 1996, ano da morte de Eazy-E (março), Tupac (setembro) e do sucesso de Snoop Doggy Doog (seu nome era assim antes). Apesar da produção efervecente nos diferentes estilos de rap, a treta entre as costas Leste e Oeste – que já tinha vitimado o rapper Tupac e, depois teria alcançado o rapper Notoriuos B.I.G. – foi o grande destaque no mundo todo.
As ruas de lá, os manos de cá
“Nos anos 90, não importava qual o estilo de rap você gostava, uma coisa era certa: N.W.A era uma banda ‘de rua’, de respeito, independente de qual seu estilo. Revelou Dr. Dre, um dos maiores produtores da história, e consolidou um estilo próprio. Quem gosta de rap autêntico tem que reconhecer o valor do N.W.A, mesmo não concordando com o que os caras diziam. E a maioria dos fãs têm de admitir que sequer entendiam o que os caras diziam. Então passava a qualidade musical que o Dre garantia, em nome de um tipo específico de ‘inocência’ que a ingenuidade linguística supria”, afirma o MC, compositor e militante Clodoaldo Arruda, do Resumo do Jazz.
É notória a influência sonora do N.W.A em grupos da segunda geração do rap brasileiro como Comando DMC, Sistema Negro, Consciência Humana, Racionais MCs (“para os manos daqui, para os manos de lá”), Desacato Verbal, entre outros. Na época, rappers, fãs e baileiros ostentavam camisetas e bonés do grupo de Compton. As festas black não podiam ficar sem os raps “Express yourself”, “Compton’s most wanted” e , para os mais radicais, o hino periférico “Fuck tha police”.
Hoje, o gangsta rap ainda ecoa em nosso hip hop. Sabemos que o estilo ganhou outras formas com a realidade dos rappers brasileiros, pois as ruas dos EUA não são iguais as do Brasil. Grande parte dos que se intitulam gangstas brasileiros são voltados aos problemas da periferia, mas o tal “foda-se” niilista ainda permanece em novos discursos.
E AS MULHERES NAS LETRAS DO GANGSTA RAP?
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