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Vinicius Preto olha para o futuro e apresenta álbum ‘Analogia de Quebrada’

Vinicius Preto olha para o futuro e apresenta álbum ‘Analogia de Quebrada’

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O rapper, historiador e produtor, Vinicius Preto, conhecido por suas rimas que retratam a realidade da periferia, lança “Analogia de Quebrada”, seu novo álbum, que examina a vida na quebrada através de uma lente de resistência e reflexão. Após os trabalhos “Canto Negro” (2019) e “Flores, Votos e Balas” (2022), Preto se inspirou nas adversidades enfrentadas durante a pandemia e revisitou suas origens, criando um álbum que compara vivências pessoais com a realidade contemporânea. A escolha do termo “analogia” reflete a comparação entre o que ele viveu e o que a sociedade brasileira enfrenta, com foco na luta e na sobrevivência dos marginalizados.

vinicius-preto-analogia-da-quebrada4-200x300 Vinicius Preto olha para o futuro e apresenta álbum 'Analogia de Quebrada'
Para este trabalho, Preto adotou o estilo “Type Beat”, uma abordagem comum em gêneros como o trap, onde beats prontos são usados como ponto de partida para as rimas. No entanto, a produção do álbum ficou a cargo de Cesar Hostil, parceiro de longa data e colaborador frequente. Hostil trouxe uma nova camada sonora, ajustando a produção às letras intensas e reflexivas de Preto.

Vinicius Preto trabalhou com vários artistas de destaque. Dimi Zumque, multiartista e colaborador de peso, trouxe sua experiência para o projeto, assim como os músicos Cesar Hostil e Afronauta, membros do coletivo Zamba Rap Clube, de onde Preto também faz parte. A participação de artistas internacionais, como Leumer e Tchembino, de Moçambique, ampliou as trocas culturais e a representatividade da periferia em escala global.

“Analogia de Quebrada” oferece uma identidade sonora que mescla samba-rock e influências do rap clássico, buscando tanto o público do rap como ouvintes de outros estilos. Segundo Preto, o álbum é um “resgate da música negra e periférica”, abordando temas como racismo e questões sociais, sem se restringir apenas a essas pautas. Entre as faixas, “Domingo de Manhã” e “Samba pro Mundo” se destacam por trazerem o samba e o rap em uma fusão que homenageia as tradições da música negra brasileira.

Representação da Periferia e Reflexão Social

Preto observa as mudanças na periferia e critica a superficialidade do consumo exacerbado presente no cenário do trap. Em faixas como “Quadros”, ele aborda o racismo e a violência policial de forma metafórica, refletindo sobre a realidade de muitos jovens da periferia. Seu papel, como artista de outra geração, é “entender as mudanças sem perder a essência do que precisa ser dito,” abordando assuntos como machismo e saúde mental de maneira relevante para os dias de hoje.

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O Futuro e o Blues no Rap

Com “Analogia de Quebrada” prestes a chegar aos palcos, Vinicius Preto já prepara um novo projeto, “Blue in Rap”, em parceria com a banda Blues In Vain, financiado pela Lei Paulo Gustavo. Esse próximo álbum promete explorar a combinação do rap com o blues, revelando o desejo do artista de experimentar e expandir suas influências musicais.

Com mais de 70 músicas lançadas, Preto vê sua trajetória como uma vitória pessoal e comunitária. Ele afirma que, embora seu trabalho seja independente e destinado a um público de nicho, seu impacto vai além das métricas. Para ele, cada verso e cada batida representam a força de uma periferia que resiste e se expressa, mantendo vivas as raízes da música negra e as lutas da comunidade onde nasceu e que inspira sua arte.

Confira a íntegra da entrevista com Vinicius Preto: 

BF: Qual foi a principal inspiração para a criação do álbum “Analogia de Quebrada”? O que te motivou a explorar essa temática?
A principal inspiração para a criação foi refletir sobre minha vida e carreira, especialmente após os álbuns Canto Negro em 2019 e Flores, Votos e Balas em 2022. O mundo estava em um momento de pouca esperança pós-pandemia, e isso me fez lembrar muito de onde eu vim. Como “analogia” é uma figura de linguagem que compara duas coisas diferentes com características em comum, a ideia foi comparar o que estávamos vivendo com o que já vivenciamos. Sendo da periferia, negro e entendendo as nuances do racismo, esse caminho me pareceu natural. Quis fazer uma analogia entre a minha quebrada e o mundo, sabendo que qualquer pessoa se identificaria, independentemente de onde ela seja.

BF: Como foi o processo de criação das letras e das melodias? Houve alguma canção que te desafiou mais?
Para este trabalho, fiz algo que jamais havia feito, mas que é uma dinâmica comum em outros estilos: o Type Beat. Ouvi muitos, escolhi alguns e fiz as músicas, depois mandei para o Cesar Hostil, que produziu o álbum, e ele criou a partir do que já tinha de rima. Acho que o maior desafio foi não ouvir demais os Type Beats para não achar que a produção final ficou muito diferente. Creio que esse foi o maior desafio.

BF: Como surgiram as colaborações com artistas como Dimi Zumque, Cesar Hostil, Afronauta, Dri Lima, Leumer e Tchembino? O que cada um trouxe de especial para o álbum?
As colaborações surgiram naturalmente, já que fiz mais de 10 músicas em um mês. Aproveitei que ficaria 10 dias em Buenos Aires, levei meus equipamentos e fui compondo as músicas já pensando nas participações. O Dimi é um multiartista com uma carreira incrível, vencedor de festivais e com música com a Elza, e já tínhamos feito pequenas coisas juntos; senti que era o momento para uma colaboração. Cesar Hostil e Afronauta são meus irmãos de Zamba Rap Clube, e eles estão envolvidos em todos os meus projetos. A Dri é um dos casos de parcerias que acontecem bastante comigo: fazer feat com artistas que não conheço pessoalmente. Ela veio através do Cesão e foi uma linda surpresa. Meus manos Tchembino e Leumer são de Moçambique; os conheci pelo projeto Barras Manning Arretadas, que o Bocada aqui divulgou bastante. Sou fã de todos que estão no projeto.

BF: Você buscava uma sonoridade específica para este álbum? Como você descreveria a identidade sonora de “Analogia de Quebrada”?
Busquei minha própria identidade e uma sonoridade que qualquer pessoa pudesse ouvir, gostando ou não de rap, acompanhando ou não o movimento. Descreveria a identidade sonora como um resgate da música negra e periférica. Mesmo que a pessoa não venha de onde a gente vem, sabe que este estilo de música fala de algo maior, que não é apenas sobre racismo, pobreza e problemas, mas também sobre resistência e alegria.

BF: Quais as principais mensagens que você gostaria de transmitir com este álbum? Quais temas você considera mais relevantes para abordar nesse momento?
A principal mensagem do álbum é não esquecer de onde se vem. É essencial saber que nossa trajetória tem um começo, e, com todas as dificuldades, faz parte do processo. Quando canto em “Quadros”, fazendo uma analogia entre obras de arte e ser “enquadrado” pela polícia, trago uma realidade de forma diferente. Acredito que mostrar a periferia como um lugar múltiplo é relevante.

BF: O que significa para você a “analogia de quebrada”? Como essa analogia se conecta com a sua própria vivência e com a realidade dos jovens da periferia?
Para mim, significa saber que existem realidades parecidas e que podemos aprender com elas. Tudo que escrevi no álbum se conecta com minha vivência, seja ela antiga ou atual.

BF: Como você enxerga a importância de conectar o rap contemporâneo com as raízes da música negra? Quais elementos dessa tradição você busca incorporar em sua música?
O rap, desde o começo na cultura hip-hop, tem o resgate das raízes como um dos pilares, seja no sampler ou nas letras. No meu trabalho, tento sempre trazer esse resgate, como fiz ao falar de samba em “Domingo de Manhã” e em “Samba pro Mundo”, modernizando o passado, como diria Chico Science.

BF: A periferia é um tema recorrente em suas letras. Como você vê a representação da periferia no rap brasileiro e qual o seu papel como artista nessa representação?
A periferia mudou, né? Com todas as dificuldades, a ascensão ao consumo transformou a rotina na quebrada. No rap, em especial no trap, muitos artistas abordam o desejo de ter mais coisas. Mas outros temas, como angústias, saúde mental e violência, acabam ficando de lado. Vejo que temos boas músicas sobre o que é ser da periferia hoje. Como artista de outra geração, meu papel é entender essas mudanças sem perder a essência do que precisa ser dito.

BF: Você acredita que a música tem o poder de promover mudanças sociais? De que forma “Analogia de Quebrada” contribui para esse debate?
Acredito, pois a música mudou minha visão de muitas coisas, ensinou-me sobre questões sociais antes mesmo da faculdade. Acho que meu álbum contribui trazendo questões relevantes. Em “From Itaquera”, falo de vivenciar a vida periférica, com amigos que morreram cedo e outros no crack, as batidas policiais, mas também sobre esperança.

BF: Como você avalia sua evolução como artista desde o início da carreira até hoje? Quais são os principais aprendizados?
Aprendi muito. Antes era CD na rua, agora é link de pré-save. Entendi rapidamente a importância de ser profissional. Vejo que o principal aprendizado foi entender e respeitar os processos e as mudanças.

BF: Qual a importância do Zamba Rap Clube para a sua carreira? Como o grupo contribuiu para a construção da sua identidade musical?
O Zamba é minha escola até hoje. Nele, aprendi com Cesão e Afronauta, que são muito ricos em conteúdo musical. Contribuí com minha curiosidade, letras e vontade de fazer, e essa mistura criou algo bonito.

BF: Quais são os seus planos para o futuro? Você já tem algum novo projeto em mente?
Após este trabalho, quero fazer alguns shows e divulgar o álbum, mas já estou com o projeto Blue In Rap em andamento, aprovado pela Lei Paulo Gustavo, um álbum de blues com rap junto com a banda Blues In Vain.

BF: Quais artistas e bandas te influenciaram ao longo da sua carreira?
Os primeiros foram os de samba, como Fundo de Quintal e Zeca. No rap, Racionais, Xis e MV Bill foram grandes influências, além de RZO e Dina Di. Do lado pessoal, destaco o Cesar Hostil e o Japão de Brasília, hoje grandes amigos.

BF: Como você descreveria seu público? Qual a importância da conexão com os fãs para o seu trabalho?
Sei que a maioria que me acompanha são pessoas de 30 anos ou mais, que já passaram da fase de “zuera”. Essa conexão é essencial, pois mantém a chama acesa e me orienta.

BF: Há algo que gostaria de acrescentar sobre o álbum “Analogia de Quebrada” ou sobre sua carreira que ainda não foi abordado?
Gostaria de dizer que, somando o Zamba, feats e carreira solo, já lancei mais de 70 músicas. Para um artista independente da periferia, que ainda faz shows e trabalha como produtor cultural, cada verso e cada batida fazem parte de um grande oceano.

BF: Como serão os shows de lançamento?
Serão dois shows: Um no Sesc Ribeirão Preto dia 15/11 e outro no Cine Caium dia 22/11, teremos algumas participações no show do dia 15 como Dimi Zumquê, Afronauta e Cesar Hostil e novidades no palco, como uma exposição da Nathalya Faria. Serão shows bem bonitos e que vão celebrar a nossa trajetória.