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Tássia Reis: negra trajetória

Tássia Reis: negra trajetória

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tassia Tássia Reis: negra trajetória

Por: Nerie Bento
Hip Hop Feminino

Ela começou de mansinho, cantava só para mostrar o que escrevia, mas acabou encantando o público e artistas como Rashid, Marcelo D2 e o mestre Kl Jay. Quem diria que a menina envergonhada do Vale, que ouvia Racionais MC’s, abriria, anos depois, o show da Turnê de 25 anos do grupo.

Tássia dos Reis Santos, conhecida como Tássia Reis somatiza trabalho, talento, empoderamento e representatividade. Sobretudo por ser uma “mulher negra, sem dinheiro no banco, sem parentes importantes e vinda do interior “.

Além de sua arte, Tássia faz questão de mostrar seu engajamento pela luta contra o preconceito. Este ano, a cantora foi convidada a participar do ELLA – 2015, em Coxabamba, na Bolivia. Confira esta entrevista que é CLACKBUM!!!

HHF – Apresentação
Tássia Reis: Meu nome é Tássia dos Reis Santos, conhecida como Tássia Reis, tenho 25 anos, iniciei minha carreira oficialmente em 2010, participando efetivamente da gravação de três faixas no disco do AXL. Porém, comecei a escrever em 2009, muito tímida e insegura em princípio. A primeira vez que subi ao palco foi para fazer um freestyle com o Kamau, numa jam de dança Especial, onde ele fez um show incrível . Superei a vergonha de subir no palco para cantar (pois já dançava) e nunca mais quis parar .

Ao contrário do que todos pensam, eu só comecei a cantar porque eu queria mostrar o que escrevia, e a partir daí começaram a elogiar a minha voz e surgiram os primeiros convites. Como ainda não tinha nenhuma música lançada, minhas primeiras aparições foram em refrões de MCs do Vale do Paraíba, como o AXL, Mc Ralph, e depois SAFARI.

Na mesma época, fui morar em SP para estudar e acabei conhecendo o pessoal que movimenta a cena por aqui. E tudo foi fluindo naturalmente. Em 2013, lancei a música “Meu Rapjazz”, que na verdade era para ser parte de uma mixtape que o produtor Esquina da Gentil estava organizando apenas com mulheres. Muitas delas não enviaram suas músicas no prazo e ele resolveu lançar individualmente.

Ele lançou a minha primeiro e, pra quem nunca tinha lançado nada, mais ou menos 3 mil views em 2 dias foi um escândalo (risos). Quando entendi o rumo das coisas, pedi licença ao Esquina e tornei essa música, meu primeiro single oficial. No mesmo ano, fizemos o Clipe “Meu Rapjazz” com a direção do Bruno Cons, também do Vale, e foi um marco no começo da minha história.

Surgiram mais convites, participei da Mixtape do Rashid, “Confundindo Sábios “, fui convidada a cantar um som com o Marcelo D2 num show, abrimos a turnê dos 25 anos dos Racionais MC’s no Rio de Janeiro, participei do Encontro Paulista de HipHop a convite do mestre KlJay, entre outras coisas.

Lancei meu primeiro EP e mais amigos e parceiros foram chegando como o Rico Dalasam, Janine Mathias, a Banda Aláfia, principalmente a Xênia França, mais do que parceiras, nos tornamos amigas também .

HHF: Processo de criação
Tássia Reis: Quando comecei a escrever, escrevia livremente sem pensar no beat ou métrica, e era muito bom, porém pra encaixar aquelas melodias e flows no beat era um sufoco. Então comecei a escrever em cima das bases, consegui manter a característica que acredito ser um diferencial, mas me adequei acredito que a poesia é uma expressão muito íntima da alma. Costumo me expor nesse sentido, tento visitar o meu mais profundo sentimento, seja a indignação, o amor, a revolta, o questionamento, a raiva, a felicidade, tudo isso para dar veracidade ao ritmo. E assim nasce meu rap, ritmo e poesia.

A inspiração é muito sutil, é preciso estar atenta para perceber a sua presença e respeitar o momento em que ela estiver por ali. Nada é bobo, fútil, ou menor. Um beija-flor voando, um beijo, uma morte, uma eleição, um cisco no olho, um olhar, tudo pode ser motivo. O que determina é a deusa inspiração, senão tudo é em vão, é só assunto e não vira música.

HHF: Relação com fãs
Tássia Reis: Acredito que a arte só existe para poder dialogar com outras almas e corpos, a arte é alimentada por quem a consome, não apenas mercadologicamente, mas pela troca mesmo. Ninguém faz arte pra si só, por mais que o sentimento do egoísmo possa persistir em muitos artistas, acredito que a real essência é a troca, é a honestidade que ela proporciona. Partindo desse princípio, os admiradores são parte disso, o que seria da minha música sem ninguém para ouvir ? Eu sempre gosto de agradecer as pessoas que me fortalecem e me acompanham seja pela internet ou nos shows. Acho maravilhoso quando cantam, quando divulgam! Quando eu comecei a rimar, nem imaginava que poderia ter esse carinho do público, agora que o tenho, o cultivo com muito amor e felicidade, e que seja longa essa relação .

HHF: Projetos
Tássia Reis: Lancei meu primeiro trabalho físico em setembro de 2014, um EP de 7 faixas que leva o meu nome. Tive a intenção de me apresentar ao mundo, com uma pluralidade e ao mesmo tempo contando um pouco de mim, do que penso, sinto e já senti .

Algumas das músicas são de quando comecei a escrever, outras já num panorama mais atual, o processo de escolha do repertório foi muito natural, respeitei a conexão entre as músicas, algumas ficaram de fora, mas terão seu tempo de sair também.

Contei com a direção do Diamante, fiz as gravações no Chocolate Estudio, onde juntos chegamos a esses resultados de interpretação. A mixagem e masterização ficaram por conta do Rodrigo Tuchê, com apoio da Produtora Comando S, contamos com apoio também da Radio Boomshot, do Zeca MCA. E as participações do meu amigo Tiago MAC, do Rio de Janeiro, e do Sã, meu amigo e parceiro de Jacareí que está no rap comigo desde o começo .

HHF: Estilo Tássia Reis
Tássia Reis: A minha proposta é fazer um rap que dialogue com as coisas que vivemos e sentimos. Parafraseando Belchior, “Sou apenas uma mulher negra de 25 anos, sem dinheiro no banco, sem parentes importantes e vinda do interior ” tenho muito a dizer, muito a expor, muito a questionar.

Quando perguntam sobre estilo eu acho complicado me colocar numa gama ou outra. Eu faço Rap e tenho diversas influencias externas, mas eu faço Rap no Brasil .

Gosto quando falam da Música Preta Brasileira, talvez seja audacioso da minha parte me sentir desse núcleo, mas se for pra me por em algum estilo por aqui, que seja nesse.

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HHF: Influências
Tássia Reis: Bom, acredito que a família tem forte influencia na infância quando a gente ainda está formando gostos e conhecendo tudo no geral. Meus pais sempre foram muito musicais e agradeço muito por isso. Minhas lembranças de infância são Clara Nunes, Jovelina Perola Negra, Belchior, Ray Charles, James Brown, Fundo de Quintal … Mais pra frente através do meu irmão eu conheci Racionais MC’s, RZO, Sabotage, Expressão Ativa, Conexão do Morro, 509-E, MVBill … Mais tarde quando comecei a dançar e conheci a Cultura Hip Hop, tive outras influências como A Tribe Called Quest, Lauryn Hill, De La Soul, Erykah Badu, Floetry, Missy Elliot, Ciara, Destiny Child, Kanye West … Hoje em dia, eu continuo sendo influenciada por tudo isso, e mais uma penca de gente. Tenho curtido muito Metá Metá, Aláfia, Chelsea Reject, Rico Dalasam , Janine Mathias, Rapsody, Naomi Wachira, Kendrick Lamar, Joey Bada$$, T’nah Apex, Hawk House, Little Simz, Oshun e meu rei, Djavan.

HHF: Importância da pagina
Tássia Reis: Acho que posso responder essas duas questões juntas porque uma é complementar a outra. Páginas como essas são importantes pelo fato de que os portais de rap no geral não contemplam as mulheres. Pra se ter uma matéria precisa alcançar um destaque muito grande, o que é complicado, se culturalmente não querem saber sobre “coisas de mulher “.

Você sabe que o “Zé num sei da onde” fez o som tal, mas a “Maria” não. Não tem espaço pra ela na mídia.
A noticia boa é que entendemos a internet como um meio de procurar e também divulgar nossos trampos. Hoje eu consigo saber que tem mulher DJ em Brasília, Rio de Janeiro, São Paulo, que tem B.girl no interior de SP, e também tem no Amapá. Quem tem MC em Fortaleza e também em Jacareí.

Estamos inventando nossos espaços. Fico feliz que consigamos nos articular dessa maneira, ao mesmo tempo acho muito complicado essa posição em que nos colocam num nicho tão específico. Como se apenas nós mulheres consumíssemos esse som, ou essa arte . A real é que – na minha página no Facebook – tenho a porcentagem de 51% mulheres e 49% homens, então a desculpa de que meu som dialoga apenas com mulheres não cola mais . Vamos criar nossos espaços sim, mas vamos invadir outros também.

HHF: ELLA 2015
Tássia Reis: Foi bem bacana participar do Ella, é um encontro latino-americano de mulheres, onde participamos de vivencias e atividades, era como um grande laboratório, além das plenárias de onde saía ideias de combate a diferentes problemáticas que enfrentamos nos diversos países.

Como a criminalização do aborto, o feminicídio, a invisibilidade da mulher negra na sociedade, a hipersexualização, educação sexual, dentre muitas questões. Esse foi o segundo encontro, o primeiro foi em Belo Horizonte, mas eu não participei.

Foi muito importante constatar as diferenças e semelhanças entre os países da América Latina. Voltei com muitos pensamentos e cheia de vontade de fazer a diferença de alguma maneira. Bora lutar!!!

HHF: Indicações para entrevista
Tássia Reis: Opa, indico : Janine Mathias, Zaika dos Santos e D’Origem.

HHF: Comunicação
Facebook.com/Tassiareisoficial
Youtube.com/tassiareisoficial
https://soundcloud.com/t-ssia-reis