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Phantom: ‘Existem aqueles que só reclamam e permanecem na mesmice e aqueles que constroem pela cultura’

Phantom: ‘Existem aqueles que só reclamam e permanecem na mesmice e aqueles que constroem pela cultura’

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PhantomCapa Phantom: 'Existem aqueles que só reclamam e permanecem na mesmice e aqueles que constroem pela cultura'
Capa do disco

Existem coisas que milhões de visualizações, seguidores, curtidas ou compartilhamentos não podem garantir e uma delas é a credibilidade nas ruas. Quando digo “nas ruas”, não são nas ruas do centro da cidade ou de bairros de classe média alta, falo das ruas das quebradas, dos extremos, das beiradas. E isso não é apenas aqui no Brasil, isso é no mundo todo, o Hip Hop é assim, as ruas te cobram o tempo todo. Cobram respeito, disciplina, humildade, lealdade, entre outras coisas, mas essas são as básicas. Nada contra quem guia suas escolhas por números virtuais, mas esse não é, nem nunca foi o meu único critério para pautas. Claro que esses números tem o seu valor, ainda mais quando são conseguidos de forma orgânica.

Onde eu quero chegar, é que muitos artistas de Rap com números estratosféricos nas redes, não tem credibilidade nem nas ruas do próprio bairro. Em compensação existem outros com números não tão altos, mas com o reconhecimento das ruas. No Rap isso conta, e muito. Phantom DK é um exemplo, tem o reconhecimento e o respeito das ruas. Não é MC virtual, está sempre presente do centro aos extremos, seja se apresentando ou curtindo. Esse ano ele lançou seu disco solo, intitulado ‘Dias Melhores Virão’. É um disco de R.A.P, assim mesmo, tudo maiúsculo. Muita rima, ritmo, poesia, protesto, reflexão, amor, esperança, com seu vocal agressivo, batidas pesadas e talvez o mais importante, grande participação dos DJs – olha só a que ponto chegamos, comemorar a participação de DJs em um disco de Rap! A abertura do disco é feita por um DJ, nem me lembro há quanto tempo não ouço isso em um disco de Rap brasileiro.

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Foto: Divulgação

O escolhido pra fazer essa preza foi ninguém mais ninguém menos que o mais zica das colagens, DJ RM. Ele é um acervo vivo de colagens, ouça a abertura desse disco e vai ver o que digo. Phantom disse, na entrevista abaixo, que essa foi a única faixa em que o DJ ajudou na escolha das colagens, mas também com o RM não tinha como ser diferente. Tem RZO, MV Bill, Racionais, Sabotage, Consciência Humana, Edi Rock, Sistema Negro, Thaide, etc… É uma abertura que realmente aumenta as esperanças, que pelo menos no Rap, “Dias Melhores Virão”. Esse título não é apenas uma mensagem de esperança para o ouvinte, mas também um trocadilho com seu sobrenome, “Dias”.

Para quem fica preso nas “time lines” das redes sociais, consumindo conteúdo patrocinado, tem centenas de razões para acreditar que o legitimo Rap de quebrada tá em baixa. Mas quem experimentar sair um pouquinho dessa bolha, por exemplo acessar o Bocada Forte daqui pra frente, vai poder conferir muitas novidades compromissadas com a Cultura de Rua.

A primeira vez que ouvi esse mano rimar foi em uma coletânea chamada ‘Boca do Lixo Vol.01’, que comprei por R$ 2,00 na mão dele mesmo, no centro de SP. Levei pra casa, ouvi, pedi permissão pra divulgar as músicas no BF, em outubro de 2005 coloquei uma faixa na 4ª Edição do Resistência Sonora, a música “Bomba Auditiva”, com participação do seu grupo Andrômeda, Zinho, Leprechaum e Cascão. Mais pra frente, em janeiro de 2006, disponibilizamos para download no BF a faixa “Bem vindo às ruas”, com as mesmas participações. Alguns anos depois, em 2008, eles participaram do disco do DJ KL Jay, ‘Fita Mixada – Rotação 33’, a qual tive a oportunidade de organizar a coletiva de imprensa. Naquela época não consegui fazer uma entrevista, mas dessa vez foi possível e abaixo vocês podem conferir.

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Foto: Divulgação

Bocada Forte: Você já tem uma caminhada longa no Rap, com muitos projetos paralelos e trampos solo. Andrômeda, Dragões de Komodo, várias parcerias, participações, Rap, Ragga, trabalho social, faz um resumo da sua história.

Phantom:
Então, comecei em 1988 levado para o metrô São Bento por um irmão meu que tem 10 anos a mais, lá conheci o Hip Hop em sua pura essência. Vendo os grandes artistas da época de perto, fiquei fascinado e daí em diante fui aos poucos me aprofundando na cultura.

Logo após comecei a andar de skate e aí conheci muito mais sons através das fitas de skate, que sempre continham trilhas sonoras alternativas que me agradavam muito. Findando meu início oficial em 93 com algumas apresentações na escola e daí em diante fui evoluindo gradativamente, fazendo shows e adquirindo experiência. Até lançar o primeiro CD em parceria com Indião (grupo Andrômeda), em 2005 (Boca do Lixo Volume 1).

Assista ao vídeo da música que dá título ao disco

Daí em diante os trabalhos fluíram e logo após veio a parceria com DJ KL Jay, onde  conseguimos expandir muito mais nosso o som. Em meados de 2009 criamos uma banca chamada LODO, que durou pouco tempo fazendo shows em alguns eventos em São Paulo, interior e outros estados (Phantom, Indiao, Yob, Criolo, Nonato e Terra Preta). Em 2011 criamos o Dragões de Komodo e lançamos o primeiro álbum no mesmo ano intitulado ‘Jurassicamente Contemporâneo’, e em seguida o segundo álbum em 2016 chamado ‘A Chave’. Eu como sempre tive uma carreira paralela solo, em 2019 desenvolvi diversos trabalhos, tais como o cd ‘Dias Melhores Virão’, EP ‘Be Yourself’, DVD ‘Phantomzilla’ e diversos singles com participações especiais de diversos irmãos que a música me deu de presente.

Ouça a participação do Andromeda no disco do DJ Kl Jay

BF: Dá pra perceber no seu som um preocupação com a dicção, você procura pronunciar bem as palavras, você se preocupa com isso ou é o seu estilo mesmo, é natural?

Phantom: Acredito que por estar no movimento há muito tempo e vir de uma época que o conteúdo era o carro chefe do rap, se fazer entender pra quem tem sede de conhecimento era um ponto mais que positivo. Ainda temos grande parte do público que tem essa identificação com o conteúdo ideológico, com as músicas e assim sendo devemos fazer com que a dicção seja mais apurada (isso aconteceu comigo naturalmente), até os ouvidos atentos do público. Sem generalizar é claro, mas o público mais jovem hoje em sua grande parte, não dá tanto valor pro conteúdo das músicas e sim pro estilo de batida e o vocal mais lírico ou Speed Flow, deixando em segundo plano a questão do conteúdo nas letras de rap. Mas tem muita coisa boa nova saindo, só pesquisar nomes como Tina Cratz, La Aura, Bruna Muniz, Themba, MT Rap dentre outros.

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Foto: Divulgação

BF: Eu sou um grande defensor dos DJs, acredito que eles precisam de alguma forma estar presentes em todo Rap. No seu disco muitas músicas tem DJ, você também tem a preocupação de ter DJs no seu Rap? Você participou da escolha das colagens usadas por eles?

Phantom:
Primordial ter scratches nas músicas, aprendi assim e vou perpetuar esta ideia, é como diz meu aliado Indião, em uma menção muito despojada sobre o fato de ter DJs nas músicas – “Rap sem DJ, é como hot dog sem salsicha” (risos). A respeito das colagens, sempre sou eu quem escolho elas, com exceção da introdução do CD, que o grandioso DJ RM também palpitou em algumas colagens a serem colocadas.

BF: Tem planos de algum dia lançar algo em vinil?
Phantom: Um dos meus sonhos a serem realizados, é o de ter um vinil tradicional com minhas músicas nas ruas. Já cotei preços neste primeiro semestre e estou tentando firmar parcerias para que este sonho se realize, estou focado nesta meta difícil, mas por enquanto isso é manter o pensamento positivo que em breve teremos sim, em nome de Jah Rastafari (risos).

BF: Se não me engano, o primeiro trampo que ouvi seu, foi na coletânea Boca do Lixo Vol.01, acho que em 2005. Comprei o CD na sua mão no centro da cidade. Você acredita que falta pra boa parte dessa nova geração, não apenas a vivência real da rua, mas também credibilidade nas ruas?

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Capa do CD ‘Boca do Lixo Vol.01 – Acervo BF

Phantom: A maior parte desta nova geração que está no movimento, acredita que as redes sociais são o suficiente, sei a real importância delas e a eficácia incisa nos trabalhos artísticos, mas estar nas ruas é algo mais que magnífico. Conhecer as pessoas e trocar experiências e energia é algo incomparável, acredito que manter um equilíbrio entre os dois caminhos de forma coerente e respeitosa proporciona resultados significativos na carreira de um artista ou grupo de rap. Esta pergunta me fez lembrar um comentário do César, do grupo Ca.Ge.Be, outrora quando ouviu um lançamento de uma música minha ano passado e o mesmo disse assim – “A essência do rap sem perfume está nas ruas”.

BF: Você mistura outros idiomas na sua música, inglês, português e espanhol. O que te levou a rimar em outros idiomas?

Phantom: Então, o pouco de sons gringos que chegavam até mim naquela época (93, 94) me deixava alucinado, coisa de correr nas veias mesmo, lembro quando adquirimos uma TV colorida um pouco melhor, tive acesso a MTV e a mente abriu muito mais e o pouco que compreendia era que o mercado internacional era e é muito forte. Daí veio minha vontade de aprender outros idiomas, e mais adiante tive o entendimento também que assim poderia imprimir uma marca única na cena, me diferenciando dos demais e criando minha identidade na música rap.

Assista ao vídeo da música “No mask”

BF: Como é essa ligação com o Wu-Tang Clan? Fale sobre Wu-Brasil, Wu-Latino.

Phantom: É explícito que sempre fui alucinado por Wu-Tang, e ao passar dos anos, com a comunicação evoluindo, através do avanço tecnológico, pude fazer algumas conexões com artistas que admiro e vivem em outros países. Nestas conexões conheci alguns irmãos que tem a mesma ideologia e estamos desenvolvendo alguns trabalhos. Foi criado um grupo de WhatsApp e fui convidado a participar, grupo onde Killa Priest e Bronze Nazareth estão presentes, além de RayRoq, que trabalha diretamente com os artistas da formação oficial do Wu-Tang Clan.

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Participei de uma música chamada “SubMachine”, produção de Bronze Nazareth onde um grande irmão chamado Visel MC de Tatuí também participou, música que tem diversos artistas sul-americanos e foi assinado como Wu-Latino e saiu em uma coletânea do Wu-Tang, com diversos artistas latinos e norte-americanos, há dois anos atrás. Lançamos um vídeo (veja abaixo), junto com o Peso Duplo, em parceria com Popa Chief do ZooNinjas (Banca do Ol’ Dirty Bastard), e outro som com Judas Priest, que tem alguns trabalhos com Cappadona do Wu-Tang, além de mais algumas alianças musicais que estão no trâmite de desenvolvimento. Gostaria de agradecer o FeraWuBrasil, que também viabiliza estas conexões musicais diretamente de NY até SP.

Assista ao vídeo de “Razor Rhymes ” – Popa Chief, Phantom, Peso Duplo part. DJ RM

BF: Você demorou quanto tempo pra finalizar esse disco? Fale também sobre a escolha das participações e produtores.

Phantom: Eu não tinha a intenção de fazer um disco, tive a ideia em uma das minhas idas pra Minas Gerais, quando em 5 dias escrevi 6 músicas, tudo fácil acesso, estúdio, gravação, instrumental e muita inspiração. Tive um grande apoio dos meus irmãos Psycoprata, PretoC e Neghaum, além dos demais irmãos mineiros que muito me fortalecem. Resolvi juntar as músicas que já tinha nas ruas com algumas inéditas e saiu o disco. A escolha das participações e dos produtores foram feitas no decorrer dos trabalhos, quem estava em sintonia comigo contribuía de alguma forma sem prévio contato, as coisas aconteciam no vapor da atmosfera que emanava energia positiva.

BF: Você tem o projeto de uma festa também né, a Downtown Fest, como é essa ideia?

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Flyer da ‘Prime Hip Hop’ de 21 de setembro de 2019

Phantom: É uma festa beneficente que ocorre mensalmente, diversos artistas já passaram pela festa que se localiza na Avenida São João, número 808, no coração da selva de pedra, sempre dia de sábado das 16h às 22h. Nesta festa conto com apoio de Marcelo Keshada e Keith B na logística, Júlio Mandrake nas Artes, além dos DJs Davison e Tonis da zona leste de Sampa. Um dos critérios para cantar na festa é comparecer no evento em uma das edições. Recentemente fizemos a primeira coletânea Downtown Fest, com os grupos que já passaram pela festa, que no mês de setembro chega a sua 17° edição. Inicia a partir de Setembro mais uma festa criada por mim chamada ‘Prime Hip-Hop’, com parceria de João Bazilio (Ibotirama Records) e Zóio3D. A primeira festa será dia 21 de setembro às 16h, no Espaço Cultural da Biblioteca Brito Broca em Pirituba, evento gratuito com a colaboração simbólica de 1kg de alimento o ingresso.

BF: Você já lançou três vídeos de músicas desse disco, porque escolheu essas faixas para os vídeos? Tem mais algum nos planos?

Phantom: A escolha dos vídeos é um termômetro do que a rua demanda pra mim, vou escolhendo aleatoriamente e vou fazendo sem crise, não tenho uma ordem cronológica de escolha, me dá na telha vou e faço, mas pretendo fazer vídeo clipe de todos sons que compõem o disco.

Assista ao vídeo da música romântica do disco, “Amor atemporal”

BF: Como você tá vendo a cena do Rap hoje, pelo menos em SP?

Phantom: Apesar de muita gente ver a cena negativamente eu não vejo só assim, neste ano estou ministrando oficinas de MC desde o início do Ano (as quartas na Escola de Artes em Osasco e as quintas no CCJ Cachoeirinha). Em relação a shows, pra mim graças a Deus nunca foram problema, a cena cresceu mais ainda, o número de adeptos e ouvintes cresceu junto com o aumento populacional nas quebradas. Um exemplo, no ano passado em Osasco tínhamos a semana do hip-hop e este ano foi o mês do hip-hop na cidade, de 16 escolas atendidas no ano passado este ano foram 32, ou seja, dobrou o número de escolas e shows também executados.

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Gaspar (Z’África Brasil), Indião e Phantom na coletiva de imprensa da ‘Fita Mixada’ do DJ KL Jay – Acervo BF

Temos um novo estilo (não tão novo assim), que a molecada dialoga bastante, o Trap, já tá inserido no nosso contexto, apesar de existir uma resistência ainda por parte de alguns do movimento, não podemos negar a expansão massiva do estilo. Posso falar com propriedade isso, pois trabalho em escola estadual na minha quebrada e vejo isso de perto diariamente, não tem como não ver. Existem dois caminhos, aqueles que só reclamam e permanecem na mesmice e aqueles que fazem, constroem pela cultura. Estou junto da segunda opção e as coisas vem acontecendo pra mim de forma muito boa e sou muito grato ao movimento hip-hop hoje e sempre!

BF: Dias melhores virão, sempre temos que acreditar. Vivemos tempos difíceis no país, principalmente nas periferias. Fazer um disco e uma música com esse título pra mim é levar ao pé da letra a expressão “Rap é compromisso”, porque esse título?

Phantom02 Phantom: 'Existem aqueles que só reclamam e permanecem na mesmice e aqueles que constroem pela cultura'
Foto: Divulgação

Phantom: Você resumiu com exatidão o tema do disco, eu quis passar um pouco de esperança pro povo, mesmo diante de uma situação adversa na qual estamos passando. Não pertenço a nenhum partido político e nunca fiz questão disso, mas entendo que a política é algo sério, que influencia diretamente nossas vidas, por isso requer nossa atenção sempre. Além de toda esta questão, meu sobrenome é “Dias” e a analogia circunda este contexto também. ‘Dias Melhores Virão” foi um marco positivo em minha vida e em breve já penso em lançar um disco novo com bastante influência jamaicana transbordando vocal raggamuffim de peso.

BF: Deixa um salve, seus contato, projetos futuros, paralelos e agradecimentos.

Phantom: Agradecimentos a todos sem exceção, mas especialmente pra minha Mãe Vera e minha filha Yasmin, que são meus combustíveis para continuar. Aqueles que queiram participar das oficinas de MCs estão todos convidados, a faixa etária é livre!

Quartas feiras na escola de Artes em Osasco as 17hs
Quintas feiras no CCJ na Cachoeirinha as 18hs
Downtown Fest e Prime Hip-Hop

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Editor de conteúdo do Bocada Forte desde 2000, envolvido com a Cultura Hip-Hop desde o início dos anos 90. Sempre nas trincheiras, da quebrada pro mundo!

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