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Memória BF | Entrevista: Nino Brown, Elly Pretoriginal e a Consciência Negra

Memória BF | Entrevista: Nino Brown, Elly Pretoriginal e a Consciência Negra

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IMG5-11-e1511186199791 Memória BF | Entrevista: Nino Brown, Elly Pretoriginal e a Consciência Negra
Zumbi dos Palmares é o símbolo da consciência negra no Brasil

Em entrevista ao Bocada Forte, KING ZULU NINO BROWN e o MC ELLY (DMN), duas personalidades que representam a militância artística, politica e cultural do hip hop, falam sobre a importância do DIA DA CONSCIÊNCIA NEGRA, onde abordam as desigualdades e identificam o papel das gerações anteriores para a formação do pensamento político do rap.

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King Nino Brown. Foto: Arquivo pessoal

Bocada Forte (BF): Quem é contra as cotas pode ser considerado racista? Ações afirmativas baseadas na raça podem causar mais desigualdade ou ódio racial?
Nino Brown: Quem é contra as cotas não é racista, mas sim uma pessoa que não entende o que está acontecendo, ou finge não entender. Na verdade, sou a favor da indenização da etnia afro-descendente, pois todas as outras vieram para o Brasil e tiveram terras pra morar e empregos, desenvolveram seus costumes e sua cultura, e sobre a etnia que já estava aqui? O que aconteceu? Foi destruída, exterminada, marginalizada, entre outras atrocidades. Como falei anteriormente, temos que ter uma indenização para a etnia afro-descendente. Não acho que vai existir ódio racial. Engraçado, quando se tinha bebedouros para brancos e negros, nessa época, quem começou a separação e o ódio racial?

Elly: Ação afirmativa é uma parada necessária sim. Recebemos a herança injusta que foi deixada em todos esses quinhentos e poucos anos. É claro que, devido ao emburrecimento em massa no Brasil, a educação pra um playboy que estudou nas melhores escolas particulares do país, não é a mesma de um moleque que estudou em uma escola de periferia, aí se torna algo injusto para os menos privilegiados, acredito que com tempo isso também mude, lutamos pra isso na real, melhores condições para o povo periférico.

BF: Qual a importância do dia 20 de novembro?
Elly: Bom, acho que o feriado do Dia da Consciência Negra tem a sua importância por ser um dia em especial para o povo preto. Uma grande maioria somente se lembra de toda a história do povo que construiu este Brasil e é em sua grande maioria a maior parte do povo brasileiro nesse dia ou no dia 13 de maio, o dia da “Liberdade”, quando na verdade a consciência do povo preto tem que ser lembrada e exaltada todos os dias por toda a sua importância e colaboração dos pretos para o crescimento da sociedade em todos os aspectos, 4P!

Nino Brown: O 20 de novembro deve representar a luta e a história do verdadeiro herói do Brasil, quando iríamos imaginar que teríamos um feriado para Zumbi dos Palmares? Só através de lutas, passeatas, protestos. Tudo isso começa em 1971, com o Grupo Palmares, de Porte Alegre, passa por 1978, nas escadarias do Teatro Municipal de São Paulo, também se desenvolve com o MNU (Movimento Negro Unificado). Através dos seus militantes, Milton Barbosa, Hamilto, Lélia Gonzales, Rafael Pinto e Levi, entre outros, que lançaram oficialmente o 20 de novembro como o Dia Nacional da Consciência Negra.

BF: Todos são iguais perante a lei como diz a Constituição? O que fazer para formarmos um país mais igual e sem racismo?
Nino Brown: Que nada, não existe essa igualdade. Quem é rico não vai preso, não paga pelos seus crimes. Enquanto existir ricos e pobres não haverá igualdade em lugar algum, pois as leis são aprovados por aqueles que não as cumprem, e quando é algo aprovado é em beneficio deles, a gente fica só com as migalhas, até que eu acredito muito nesse governo, foi o que mais se preocupou com os pobres, pouco ou muito, mas fez algo. Com certeza, igualdade para todas e todos é fazer uma faculdade, é poder comprar algo para sua filha ou filho, viver bem morar bem, ter direito a educação e conhecimento, isso é fundamental para todos. Se isso acontecer, não teremos mais pessoas morando na rua, comendo coisa no lixo. É uma vergonha uma cidade igual a SP, que ainda tem nossos afros-descendentes nesse tipo de situação, pessoas passam ver isso e acham que não tem nada a ver com essa situação, tem sim! E os impostos que pagamos? Para onde vão?

Elly: Olha, essa é uma parada meio que impossível, porque o racismo e a discriminação no Brasil fazem parte de algo interminável, claro que tentamos, com o passar do tempo, diminuí-los, de acordo com as nossas possibilidades e repassando para nosso filhos, sobrinhos e a toda pessoa que quer escutar a aprender a verdade. Toda a nossa bagagem histórica e nosso aprendizado por todos esses 20 e poucos anos que temos de Hip-Hop. Agora, tem que investir em educação, dar carinho, amor, ensinar o certo e o errado, a respeitar os pais e os idosos e fazer os mais jovens entenderem que racismo e qualquer tipo de discriminação é uma doença, temos que, de acordo com as nossas possibilidades, injetar a cura com todo o nosso conhecimento, de maneira dosada.

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Elly Pretoriginal. Foto: Arquivo pessoal

BF: O Rap politizado, que tinha grande discurso sobre a questão racial brasileira, ainda existe atualmente?
Elly: Eu costumo dizer que estamos vivendo a era da música descartável, ou a da batatinha da onda, que se hoje o sabor é churrasco, todo mundo só quer com sabor de churrasco, amanhã muda pra o sabor de queijo e todo mundo vai atrás do queijo. O brasileiro, infelizmente, foi condicionado à isso, devido, talvez, à falta de cultura musical, pra uma grande maioria e também pela mídia televisiva. Continuamos escutando e assistindo tudo o que não é bom para os ouvidos, para que as pessoas se tornem cada vez menos inteligentes, é um processo de emburrecimento em massa. O Rap dos anos 90 teve a faca e o queijo na mão, falando de Zumbi, Malcom, Black Panthers, Mathin Luther King.

O jovem preto acreditava que podia mudar o mundo e as pessoas através do Hip-Hop. A vida e a história dessas pessoas, que foram grandes formadores de opinião, foram base central pra formação tanto do DMN, quanto de outros grupos. Alguns que estão no cenário do Hip-Hop até hoje, outros se diluíram com o tempo. Até mais ou menos 1997, o discurso politizado de vários grupos ainda era bem forte, até o momento que a maior parte dos rappers se penderam no gangsta e mudaram totalmente o contexto de suas letras, esqueceram do discurso que foi passado a toda uma geração, que foi a dos anos 90.

Naquela época (anos 1990), eram jovens adolescentes e crianças, hoje são pais de família que absorveram muita coisa do que foi passado por nós que, de uma certa forma, nos tornamos formadores de opinião. Isso hoje é lamentável, pois uma parte do Rap acredita que o futuro do Rap é fazer sons ou músicas pras pistas, outros querem ficar no anonimato e se dizem undergrounds, afirmam que não querem grana e que o “da hora” é copiar o filme do Eminem (“8 Milles”), ficar um tirando onda com a cara do outro, sem ter diretriz alguma em seu trabalho. Tudo evoluiu, as pessoas, os pretos, a autoestima, a dança, as levadas no Rap e as produções também, mas hoje,o rap que fala só de política, em razão de todos esses fatores, já não funciona como antes. Eu e meus parceiros de grupo acreditamos que, pela base da formação, até mesmo do DMN, não tem como não falarmos dos assuntos que sempre abordamos em nossas letras, porém, temos que evoluir, fazer música boa é o nosso intuito hoje, independente do contexto da letra ser política, romântica, pista ou seja lá o que for! Para o DMN, essa é a cena hoje, o que não quer dizer que não vão ter as pessoas que vão continuar a enxergar o Rap como nos anos 90, nós respeitamos também.

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Designer Gráfico e Editor, Noise D tem formação em Comunicação Social e está no time do Bocada Forte desde 2001.