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‘O rap de antes não é o mesmo de hoje’. A mercantilização do rap | Por Arthur Moura

‘O rap de antes não é o mesmo de hoje’. A mercantilização do rap | Por Arthur Moura

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Finalmente estamos disponibilizando com exclusividade a dissertação de mestrado (FFP-UERJ) “O Ciclo dos Rebeldes: Processos de Mercantilização do Rap no Rio de Janeiro“, escrita pelo historiador e cineasta ARTHUR MOURA, que traz um pouco as problemáticas atuais da cultura hip hop, mais especificamente da música rap, “pois é necessário – e até fundamental – que possamos compreender o que significa para o rap ter se tornado uma mercadoria“, esclarece Arthur.

O rap de antes não é o mesmo de hoje. Ele passou por processos fundamentais de afirmação e também de alienação do seu próprio processo produtivo e das suas formas de fazer“, explica o autor. Mas o rap ainda guarda alguns elementos de resistência, e ainda que constantemente cooptado pelo grande capital e seus valores, é necessário repensar o papel da crítica para assim trilhar um caminho de fato emancipatório. Sem debater questões centrais é praticamente impossível avançar na luta pela liberdade artística e cultural em meio as tensões do capitalismo.

IMG-7 'O rap de antes não é o mesmo de hoje'. A mercantilização do rap | Por Arthur Moura
Arthur Moura. Foto: arquivo pessoal

Segundo Arthur, a decisão de disponibilizar o seu trabalho dissertativo em primeira mão no Bocada Forte foi muito por conta do reconhecimento que ele deve não só ao site, mas aos camaradas do rap que contribuíram com seus estudos e produções. A intenção do autor é fazer com que todos penetrem cada vez mais na história formadora da cultura, o que só se pode dar, segundo Arthur, a partir de críticas contundentes às contradições internas ao rap e ao hip hop e à sociedade capitalista de uma maneira geral.

Como se chega ao quase completo esvaziamento do sentido da cultura hip hop ou das culturas de resistência, de uma maneira geral, inserindo no seu interior uma categoria absolutamente destrutiva aos subalternizados e aos que se pretendem resistência como um dos elementos centrais? Como se dá a captura do seu propósito social e da sua evidente potência revolucionária? E a que ou quais propósitos serve tudo isso? Esse, a meu ver, é um problema que os próprios agentes da cultura hip hop ainda se recusam a pensar

Uma recente palestra publicada como “Palestra Hip Hop: arte, cultura, sociopolítica e mercado” [assista abaixo] – ministrada por Thiago Monge, do grupo Família de Rua -, resume bem este problema que me parece central na cultura hip hop, a saber, a sua mercantilização. “Ora, uma vez em que o mercado se torna um elemento da cultura hip hop – assim como o DJ, o Graffiti, o B-Boy, o MC e o conhecimento -, temos aí um quadro onde a completa apropriação da cultura pelo capitalismo se dá de forma a legitimar as suas práticas no seu interior tendo à frente um agente da cultura afirmando ser o mercado o sentido dela“, diz o historiador.

Como, então, se chega a esse quadro? Como se chega ao quase completo esvaziamento do sentido da cultura hip hop ou das culturas de resistência, de uma maneira geral, inserindo no seu interior uma categoria absolutamente destrutiva aos subalternizados e aos que se pretendem resistência como um dos elementos centrais? Como se dá a captura do seu propósito social e da sua evidente potência revolucionária? E a que ou quais propósitos serve tudo isso? Esse é um problema que os próprios agentes da cultura hip hop ainda se recusam a pensar. Recusam na medida em que têm para si certo lugar de prestígio ou de poder nas relações de consumo e mercado negando o debate crítico como um corpo estranho, já que isso nos obrigaria a pensar o que de fato vem a ser o mercado na sociedade capitalista e os seus efeitos na cultura. Por isto a dissertação tem um capítulo especial dedicado às ideologias e ao fetiche da mercadoria, pois a música rap tornou-se uma máquina de propaganda de estilo de vida e consumo. O rap ou os rappers buscam inclusão no mercado, nas televisões, nas grandes marcas e empresas e transformaram a si próprios em empresários ou empreendedores numa cega busca por ascensão social. Dessa forma a cultura hip hop agoniza. Se afunda em sua própria miséria.

No dia da defesa do trabalho que aqui disponibilizo, [explica Arthur], um dos professores me questionou perguntando-me para quem eu escrevia. Para a Universidade? Lendo e relendo o meu trabalho chego a conclusão de que ele é como um livro de formação política (que também tem seus limites e defasagens, claro). Os acadêmicos possivelmente lerão. Mas no momento da escrita busquei dialogar sobretudo com o próprio rap, suas cenas, personagens, grupos, enfim, com os agentes da cultura. São esses, nós, que precisamos pensar nas contradições internas à própria cultura e que não foge ao contexto sócio-político de uma forma geral. Por isso, o leitor perceberá as longas passagens sobre os contextos sociais do Rio de Janeiro, mas também do mundo de uma forma geral e um debate com diversos autores e estudiosos do rap.

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Arthur Moura durante o lançamento do documentário ‘O Som do Tempo’. Foto: arquivo pessoal

Este estudo é um ponta pé inicial sobre a construção da crítica no rap e está intimamente ligado aos meus dois longas sobre o rap carioca, “De Repente: Poetas de Rua” (2009) e “O Som do Tempo” (2017) – [assista abaixo].

Da crítica nasce o conhecimento, elemento essencial do hip hop. Pelo fato da cultura ter se mercantilizado a crítica fora jogada ao ostracismo, precisamos, portanto, resgatá-la. É preciso construir uma teoria crítica nesse sentido. Espero de alguma forma ter contribuído com o debate. Boa leitura!“, completa Arthur.

[+] Clique e faça o download da dissertação de Arthur Moura, ‘O Ciclo dos Rebeldes: Processos de Mercantilização do Rap’ [Formato de arquivo PDF. Clique com o botão direito do mouse e em ‘Salvar Como’]

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