‘Little Brother é uma dupla desde 2007, isso é definitivo!’
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Exclusivo | Big Pooh fala sobre o novo álbum do Little Brother
O ano era 2002, o DJ Zegon (Zé Gonzales/Tropkillaz) foi morar em Los Angeles, mas eu falava com ele por MSN quase toda noite e madrugadas. Eu resolvi salvar e transformar em entrevista uma dessas conversas, que acabei perdendo nas inúmeras formatações de HD e nunca mais recuperei, sendo assim não consegui publicar (mas eu tenho guardada uma entrevista com ele, de 2001, que em breve republicarei aqui). Conversamos sobre diversos assuntos e lembro de uma indicação que ele deu. Eu perguntei se tinha algum grupo novo nos EUA, alguma revelação, e aí ele disse: “Tem um grupo chamado Little Brother, que todo mundo tá falando que é o novo A Tribe Called Quest.”
Imediatamente fui atrás de informações sobre o grupo, descobri pouca coisa. Algum tempo depois começaram a circular mais informações e um mano meu conseguiu um CDR com o primeiro disco deles, “The Listening” (2003). Realmente era muito bom. A Golden Era tinha superado o bug do milênio e as suas sementes estavam brotando. Só fiquei um pouco bravo com a pessoa que conseguiu o CD, não consigo lembrar quem era, mas chamei o mano e falei – “obrigado pelo CD, mas você podia ter conseguido um que não fosse de uma rádio né! O bagulho tá cheio de vinheta!” O pessoal mais experiente sabe que era comum você baixar ou gravar músicas que eram de rádios, e isso enchia o saco, prejudicava a playlist.
Nem eu e nem o responsável por conseguir o CD sabíamos do que se tratavam as vinhetas e eu também nunca comentei com ninguém, até porque depois que descobri o que era, dava até vergonha de falar. As vinhetas eram da rádio imaginária criada pelo trio Phonte, Big Pooh e 9th Wonder. Acho uma ideia genial hoje, mas na época me irritou. Agora, 16 anos e 5 discos depois, consegui uma entrevista com um dos integrantes do grupo, e perguntei sobre as transmissões imaginárias (a rádio e a TV) e também sobre o personagem Percy Miracles (o alter-ego de Phonte), que infelizmente faleceu.
Praticamente dois anos depois da conversa com Zegon, aqui mesmo, o DJ Tamenpi, colunista do BF naquela época, indicou novamente o CD do Little Brother, ele escreveu em 17 de dezembro de 2004:
Little Brother – The Listenning
Pra quem não conhece Little Brother, este é o grupo do 9th Wonder, uma das maiores revelações na produção de Rap dos últimos tempos. É um grupo novo, esse é o disco de estreia, saiu no começo do ano passado e pra mim foi um dos melhores discos lançados em 2003.
Além de 9th Wonder, o grupo é formado pelos excelentes MCs Phonte e Big Pooh que são muito bons, nas letras e na rima. Esse grupo com certeza foi a revelação do Rap underground de 2003. O disco é excelente.
Destaques: “The Way You Do It”, “Away From Me”, “Speed”, “Whatever You Say”.
Ao procurar no Acervo do Bocada Forte, encontro inúmeros elogios sobre o trio, tanto de brasileiros quanto de estrangeiros que entrevistamos nesses 20 anos. Eles realmente fizeram a diferença e conseguiram fazer com que artistas do mundo inteiro, que vinham fazendo a mesma coisa, insistissem nas carreiras com aquele estilo de Rap. Se formos falar dos softwares usados por 9th Wonder, como por exemplo o Fruit Loops (FL Studio), aqui no Brasil era uma febre utilizar este programa. O surgimento do Little Brother, com as produções do 9th Wonder, mostraram para outros artistas que esse realmente era o caminho, ainda mais aqui, que a MPC e outros equipamentos comuns no Rap não eram fáceis de conseguir. Muitos críticos do pessoal que usava o software, tiveram que engolir a seco qualquer argumento sobre a qualidade do que era produzido com o FL Studio.
Hoje, os “pequenos irmãos”, ou irmãos mais novos do Rap, não são mais um trio e, claro, também não são mais tão novos assim. Desde 2007 eles são uma dupla e na entrevista Big Pooh deixou bem claro – “isso é definitivo”. Ele e seu parceiro Phonte se reuniram novamente e lançaram mais um grande trabalho, “May The Lord Watch” Na mesma pegada, a mesma energia, positividade, leveza, assim como as suas maiores referências, A Tribe e De La Soul, eles mostraram o quanto são bons. A reunião dos dois tem relação com um de seus ídolos, de acordo com Big Pooh, eles se reaproximaram após a morte de Phife Dawg (A Tribe Called Quest), em março de 2016. A entrevista foi toda respondida por Pooh, que aliás, rimou sobre serem o “novo A Tribe” na música “Can’t win for losing”, do disco ‘Get Back’ (2007).
É muito difícil falar de LB e não falar da Golden Era e seus grupos icônicos, pois o trabalho deles é um dos grandes frutos dessa “era de ouro”. ‘The Listening’, aquele do CDR cheio de vinhetas, foi um marco para o Rap underground do mundo todo. Os samples, os timbres, as rimas, o flow e a inovação de um disco praticamente narrado e apresentado em uma rádio fictícia foram o incentivo para os fãs irem atrás de qualquer projeto ou participação que eles estivessem envolvidos.
Em junho de 2012, Phonte e 9th Wonder apresentaram-se em São Paulo. Confira:
A entrevista a seguir teve pontos esclarecedores, como o motivo que os levou a se aproximarem novamente, já citado acima, e também sobre a foto da capa desse novo álbum. Particularmente, eu já escrevi aqui no BF, interpretei a foto como se o vão entre eles fosse a ausência do 9th Wonder, e Big Pooh explicou o que ela representa, mas, ao mesmo tempo, disse que ela está aberta a interpretações. Falou sobre o lado espiritual e religioso, algo que está evidente no título do álbum, sobre a TV fictícia UBN, a morte de Percy e muitos detalhes sobre este novo trabalho. Leiam a entrevista e aguardem, pois teremos muitas outras, nacionais e internacionais!
Bocada Forte: Para começar, porque deram esse título ao disco?
Big Pooh: A morte é geralmente o que aproxima pessoas que não se vêm há algum tempo. A morte de Phife, do A Tribe Called Quest, nos uniu. No universo fictício do Little Brother, a morte de Percy é o que nos uniu novamente para este álbum. ‘May The Lord Watch’ é um pedido para que Deus cuide de nós enquanto seguimos ao longo da vida e, quando estamos separados um do outro, nenhum dia é garantido.
BF: Fale sobre a UBN (U Black Niggas Network)?
Big Pooh: UBN foi criada como nossa estação de TV fictícia, no nosso álbum de 2005, ‘The Minstrel Show’. O retorno dela nesse disco é uma homenagem aos fãs antigos e ao mesmo tempo, uma forma de não perder novos fãs.
BF: O 9th Wonder não está mais com vocês, isso é definitivo ou os fãs ainda podem sonhar com todos juntos novamente?
Big Pooh: Little Brother é uma dupla desde 2007 e vai seguir em frente. Isso é definitivo.
BF: No início, em 1998, vocês eram como os “little brothers” (pequenos irmãos) de grupos como A Tribe, De La Soul, PE… Hoje quem são os “little brothers” de vocês?
Big Pooh: Nossos “irmãozinhos” são aqueles artistas que foram e/ou são influenciados pelo que fazemos musicalmente.
BF: A UBN anunciou a morte do Percy Miracles, o que aconteceu com ele?
Big Pooh: Percy viveu uma vida gloriosa. Todos nós temos um encontro final, por acaso essa foi a vez dele.
BF: Conhece algo sobre a música ou o Rap brasileiro?
Big Pooh: Não sei muito sobre o cenário musical brasileiro. Eu ainda não tive a sorte de viajar para o Brasil, espero que isso mude em um futuro próximo.
BF: Fale sobre a música “Black magic” e porque escolheram ela para o primeiro vídeo? Vai ter mais vídeos?
Big Pooh: Escolhemos essa faixa como o primeiro vídeo. Achamos que seria uma boa música para nos apresentar para aqueles que estão conhecendo o Little Brother agora. Foi também o primeiro vídeo que gravamos em nosso estado natal, Carolina do Norte. Definitivamente, teremos mais vídeos chegando.
Assista ao vídeo da música “Black magic”
BF: No skit “Inside the Producer’s Studio” vocês brincam com um produtor imaginário Roy Lee. Sabemos que existem muitos “Roy Lees”, aqui no Brasil também. No skit ele fala sobre os samples terem acabado, vocês acham que as plataformas digitais e suas regras prejudicam a produção de Rap feita com samples?
Big Pooh: Não. Os samples são a raiz do Hip Hop. Enquanto alguns optam por se afastar do uso de samples, para manter todas as suas músicas publicadas ou para evitar a tarefa tediosa de limpar os samples, o Rap sempre terá os beatmakers que preferem os samples.
[+] Ouça a mixtape Especial do acervo BF, por DJ Rocaferr
BF: Vocês fizeram muitas coisas enquanto estavam separados, muitas participações e parcerias. Porque se separaram?
Big Pooh: Nosso relacionamento pessoal precisava ser reparado. Nossa parceria não era apenas um relacionamento comercial.
BF: Com o álbum pronto, quais os próximos planos? Já tem datas para uma turnê? Há a chance de virem ao Brasil?
Big Pooh: Estamos agendando as datas para a turnê e espero que o Brasil esteja no nosso futuro.
BF: Qual música resume o que quiseram transmitir com esse disco?
Big Pooh: Todas as músicas transmitem a mensagem, não há faixas nesse álbum só para completar a tracklist. Queríamos mostrar que ainda estamos no topo do nosso jogo e também emanamos a boa energia que tivemos ao fazer este álbum. Ele também fornece aos MCs mais jovens um modelo para envelhecer graciosamente no Hip Hop.
BF: As letras de vocês são muito positivas e com referências ao ‘SENHOR’, qual a religião de vocês?
Big Pooh: Nós dois somos mais espirituais do que religiosos. Eu fui criado cristão. Não frequento a igreja regularmente, mas sinto que ainda tenho uma boa conexão pessoal com Deus.
BF: Você sabe dizer quais os equipamentos e softwares foram usados na produção do álbum?
Big Pooh: Tivemos vários produtores trabalhando neste álbum. Também tivemos músicos adicionando diferentes elementos às músicas. Eu diria que uma grande variedade de equipamentos e softwares foi usada na criação deste álbum.
BF: Qual DJ participa do disco?
Big Pooh: Nosso DJ de turnê, de longa data, DJ Flash. Ele faz scratches e participa nos vocais da faixa “What I Came For”.
BF: Poderia explicar sobre a foto da capa? Eu entendi o espaço entre vocês no sofá, como a falta de alguém, 9th Wonder por exemplo. É isso?
Big Pooh: Quando tiramos a foto para esta capa, nós estávamos supostamente acompanhando o funeral de Percy. As grandes janelas atrás também representam como nossas perspectivas cresceram desde o ‘The Listening’, onde estávamos posicionados na frente de janelas menores. Portanto, essa não era nossa intenção, mas a capa está aberta para interpretação.
BF: Deixe uma mensagem para os brasileirxs, muita gente gosta de vocês aqui.
Big Pooh: Agradecemos pela atenção aos projetos em grupo e os solos. Esperamos que, assim como vocês curtiram nossos outros, também gostem deste álbum. Estamos ansiosos para tocar no Brasil e nos apresentar para nossos fãs por aí.
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